sexta-feira, 25 de julho de 2014

Resenha do livro Homossilábicas - Volume 3

Homossilábicas

Trata-se de um projeto da Editora Escândalo que convida escritores de temáticas LGBT a participar de um concurso de contos, e a partir disso realiza a publicação de um livro com os autores selecionados.


Em sua terceira edição, conta com 11 contos que exploram diferentes nuances do que seriam amor e desejo.

No primeiro conto chamado Presente de casamento,do autor Alexandre Calladini,relata a história de João Alfredo Werneck,um famoso fotógrafo de casamentos que depois de uma desilusão amorosa do passado não acredita mais no amor e só realiza o seu trabalho por ser algo rentável. Quando o destino lhe reserva uma bela surpresa ele é chamado para fotografar o casamento de Cristina e o Amadeu,antigos colegas de faculdade. Sendo que Amadeu foi o seu grande amor do passado e ficou desconsertado com a situação. Mesmo em turbilhão emocional,seguiu adiante com o seu trabalho até que há um encontro com Amadeu no momento em que está fotografando o noivo a espera da noiva no altar, e diante do reencontro Amadeu fica emocionado e sua mãe pede que o fotógrafo o leve até a sacristia para se recompor. Há uma conversa tensa entre os dois a respeito do passado e de sentimentos que ainda estavam presentes em seus corações. A leitura dessa história me fez perceber quando há algo mal resolvido em sua trajetória o destino sempre lhe reservará um encontro para o dito acerto de contas,para assim se poder seguir em frente sem amarguras,e,quem sabe, surpreender com um belo desfecho. Cabendo a você determinar o que será relevante a ser considerado como as linhas iniciais de sua futura jornada.

   Alexandre Calladini 

No segundo conto, chamado Sobre o Amor Definitivo, da autora Anita Prado, trata-se de uma carta escrita por César para seu ex-namorado Rogério, em que fala de seus sentimentos em relação a traição sofrida, da vontade que teve de ir a um bar tomar um porre para se consolar do seu rompimento. Quando, no caminho, passa em frente a uma igreja evangélica onde alguns “irmãos” se reuniam com bíblias nas mãos. Depois dessa cena foi até o bar, e optou por tomar um suco por lembrar que sempre depois de uma bela noite de bebedeira sempre vem acompanhada de um dia de ressaca. Logo, volta para casa e acende uma vela para seu anjo da guarda e para Deus. Sentado na beira de sua cama tem um encontro surpreendente que lhe consola com belas palavras, e lhe faz desmitificar conceitos do que seria o verdadeiro amor. Ao ler este conto percebi que o consolo para suas angústias está maior do que se pensa e que os seres humanos devido a seus prejulgamentos tendem a oprimir uns aos outros, e, com isso geram traumas e conflitos desnecessários, que impedem os ditos rejeitados por possuírem uma maneira diferente de ver a vida de se aproximarem de sua espiritualidade por estar enraizada em conceitos tão arcaicos.

                                                   Anita Prado 

O terceiro conto, chamado Velha-Guarda, de mesma autora, conta a história de uma lésbica masculinizada que tem um amigo gay chamado Xuxa, que segundo a personagem, busca explicação para tudo na vida. Segundo seu amigo, ela pode ser na verdade um homem trans, e não uma lésbica, por ter conceitos e pensamentos de uma essência masculina. Mas, ela se identifica como sapatão. Ela se encontra perdida no atual cenário lésbico, pelo fato de se dizer da velha-guarda. Por não conseguir entender como duas lésbicas masculinas ou duas lésbicas femininas podem se relacionar entre si, e que muitas optam por um visual que permeia entre o feminino e masculino. Esta história me fez entender que muitas ditas lésbicas masculinizadas, por medo ou falta de informação, se escondem sob essa identidade para poderem seguir vivendo sem medo de grandes conflitos que a transexualidade traz em nossa sociedade. Como por exemplo, nascer em um corpo distinto de seu ser.

O quatro conto, chamado Aquele Que Se Morde Para Experimentar o Corte dos Dentes, do autor Rodrigo Machado, relata a história de um rapaz que é ajudante de obras e passa para o Sr.Florisvaldo, em reformas de salas comerciais, e em construções através de Marcos que conhecia o seu avô. Ao lado de Leno, Carlos e Marcos vivencia muitas experiências em prostíbulos e bares. Vivencia a exploração de um trabalho hostil e sem grandes perspectivas, mas que ao menos lhe proporciona diversões e um meio de subsistência. Certa noite, em um trabalho, percebe uma estranha movimentação no quarto em que estão os seus companheiros de trabalho, e, diante desse episódio fica sem entender o porquê de estar desprezado por eles no dia seguinte. Ao ler esse relato percebi o quanto o machismo é presente na sociedade, e que ele faz com que homens estejam com mulheres para usá-las sexualmente, e também para a manutenção de sua virilidade através de relacionamentos como, por exemplo, casamentos e que muitos possuem desejos homossexuais, e os vivem na clandestinidade por medo de perderem o seu papel de homem na sociedade, por entenderem que ao ficar publicamente com o mesmo sexo estarão renunciando aos privilégios da masculinidade.

                                                    Rodrigo Machado 

O quinto conto, chamado O Filho do Pai: a dor do amor, do autor Daniel Manzoni, relata a história de um pai que tem um filho homossexual e uma mulher com problemas psicológicos que rejeita totalmente a homossexualidade de seu filho, e ele, envolto nesse conflito familiar, se vê perdido, e quando tem um encontro com um rapaz da mesma faixa etária e vão para um café conversar, e em seguida, se dirigem até um hotel no centro da cidade. Ele vivencia a sua primeira experiência homossexual, para assim buscar entender o que o seu filho busca em um homem, e depois dela se sente mais perdido, e quando vai para a casa discute bravamente com o seu filho. Depois da discussão, ele fala ao filho que ele não precisaria buscar fora de casa aquilo o que lhe faltava. A lição que fica deste conto é que enquanto a sociedade não entender que a homossexualidade é uma forma de amar como qualquer outra, as famílias estarão vivenciando conflitos desnecessários aos seus membros, e fazendo com que muitas descobertas que deveriam ser encaradas de forma saudável, sejam entendidas como possíveis distúrbios, por não se enquadrem ao padrão social.

                                                      Daniel Manzoni

O sexto conto, chamado Memórias Levantadas Pelo Vento, do autor Miguel Vicentim, relata a história de um rapaz que tem o seu mundo centrado por Fábio, o grande amor de sua vida, só que por desencontros da vida eles não estavam mais juntos. O que seria mais um final de semana de sessão de cinema solitária, acaba conhecendo Marco, um jovem moreno alto, bonito e sensual. Os olhares se encontraram e telefones foram trocados. Um telefonema foi dado, e com isso um novo encontro acontece na casa de Marco, já que seus pais tinham viajado. Os desejos do encontro anterior foram saciados, e na noite seguinte eles se despedem com um beijo ardente e a promessa de um novo encontro. Como a vida não pode deixar de surpreender, Fábio depois de algum tempo surge na vida do nosso personagem, e ele fica dividido entre o passado e o presente. Um trecho presente no livro, em minha opinião, define a mensagem que o escritor quis transmitir: “Não existem respostas, não existem justificativas, existem apenas narradas. E muitas destas histórias estavam ao nosso lado, espalhadas pelo chão.”.

                                         Miguel Valentim 

O sétimo conto, chamado Transformações do Amor, do autor Ben Oliveira, relata a história de Boyce, que vive a sua homossexualidade de forma escondida e sem grandes envolvimentos, por ser casado com Lauren, que sempre foi sua confidente e sabia desde sempre de sua situação. Casaram-se e tiveram uma filha, como manda o padrão social estabelecido. Lauren também seguia a mesma filosofia de seu marido, se envolvia sexualmente com outros homens. Mas, nada de envolvimento emocional com nenhum deles. Esse cenário passa a se modificar com a chegada do jovem Joca, um peão que vai até a fazenda deles em busca de emprego e de um lugar para ficar, nem que seja por pouco tempo. Boyce se comove com a situação e conversa com sua esposa para que o rapaz possa ficar na fazenda, mesmo que seja por um tempo, e ela permite.  Com a convivência, Boyce e Joca passam a conversar cada vez mais, e vivenciam deliciosas experiências sexuais, e o sentimento entre os dois se desenvolve. Boyce se vê perdido diante da possibilidade de amar um homem, e ao mesmo tempo ter de manter a sua vida de casado.  Na leitura dessa história entendi que o amor surge nas situações mais improváveis, e que por mais se fuja dele, uma hora ou outra ele nos encontrará em nossa jornada. Que a vida de aparência traz muitos desencontros e infelicidades que se acumulam com o tempo e toda uma trajetória pode ser perdida se não houver luta para se ser quem é na realidade.

                                          Ben Oliveira

O oitavo conto chamado, Da Cor do Açaí, do autor Sérgio Viula relata a história de um homem solitário que com a chegada de seu novo vizinho, Pedro Paulo, que apesar do nome cristão, era filho de um holandês com uma índia. Ele notava toda a beleza e solidão que existia em seu novo vizinho. Até que um dia há uma aproximação entre os dois e passam a conversar sobre algumas coisas na varanda de Pedro Paulo. Só que o nosso protagonista convida o vizinho para conhecer o seu trabalho de tradução em sua casa. Lá, ele se mostrava maravilhado com as traduções do protagonista, e ele fala de mitos gregos em que se abordava a história de amor entre dois homens e nada disso parecia chocar Pedro Paulo. Eles se tornam mais cúmplices e o vizinho confessa que adorar nadar e logo surge o convite do tradutor de irem juntos nadar. Quando lá chegam há um total estado de contemplação por parte dele ao corpo daquele mestiço com traços indígenas e holandeses. O que me marcou nessa narrativa é o fato que apesar das convenções sociais impostas por diferentes sociedades, quando alguém deseja realmente se encontrar em sua trajetória precisa muitas vezes ir para outros lugares em que possa recomeçar sem as amarras do passado e que o sentimento de desejo pode muito bem, com o tempo, se transformar em algo profundo basta se abrir para isso.

                                             Sérgio Viula 

O nono conto, chamado Era, do autor Felipe Moreira, relata um jovem que acaba conhecendo um rapaz em uma festa. Conversaram por um tempo sobre casualidades da vida, e logo o desejo entre eles fala alto quando se beijam e se abraçam. Depois de um tempo, contemplam juntos o céu. Eles se sentiam conectados como se tivessem se conhecido há muito tempo. O nome dessa narrativa me chamou atenção pelo fato de que simboliza quando não importa o tempo em que se conhece alguém, ou em que ocasião o conheçamos, o grau de importância que terá em nossa vida dependerá do grau de conexão obtido nesse primeiro encontro. Por isso, ao lê-lo me senti em meio aquela frase clichê: "era como se eu tivesse conhecido há décadas".

                                            Felipe Moreira

O décimo conto, chamado Vagalumes nos Jardins, do autor Cìcero Edinaldo, relata a história de um rapaz que perdeu sua mãe muito cedo e ficou aos cuidados de sua tia que tinha dois filhos. Ele era tratado como se fosse da família, e por isso se sentia parte integrante daquele lar. Em sua adolescência o seu primo Èsau lhe surpreende com declarações amorosas, e ele que também nutria um sentimento por seu primo, logo se rende a esse sentimento. Eles passaram às escondidas, a tere relações sexuais por três vezes por semana, só que com o passar do tempo, Èsau já não era mais tão carinhoso e só o procurava para satisfazer suas necessidades sexuais. Inconformado com isso, confronta o seu primo para uma conversa e descobre da pior maneira, como era visto na realidade por ele. A depressão toma conta de seu ser e logo desperta a preocupação de sua tia atenciosa. E ele sempre na defensiva, sem querer recuperar a sua autoestima. A mensagem contida nessa narrativa é que nem sempre os desejos carnais são bons conselheiros quando esperamos algo mais profundo de uma pessoa, e que devido ao preconceito interno e externo, muitos acabam não assumindo o que sentem na realidade e acabam magoando os outros e a si mesmos.

                                           Cícero Ednaldo

O décimo e primeiro conto, chamado O Ponto do Amor, do autor Tales Gubes, relata a história de um rapaz mais velho que se apaixona a primeira vista por um mais novo, quando o vê num ponto de ônibus. O protagonista tem delírios românticos com o seu amor, e acredita na possibilidade desse amor um dia se concretizar. Esta última narrativa nos mostra que, às vezes, a não realização de uma relação, ao invés de deixar alguém amargurado e triste, pode levá-lo a ser esperançoso e crente em novas possibilidades que a vida pode trazer.

O projeto Homossilábicas além de fazer com que escritores e escritoras possam mostrar o seu talento como contistas, revela a multiplicidade existente na literatura LGBT.

                                                Tales Gubes



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Espero que tenham gostado. Em breve novas resenhas! 





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